Esta semana, faremos uma comparação entre as propostas filosóficas de Sócrates e de Platão e aplicá-las à interpretação do filme Matrix.
Obviamente, interpretação é algo de cunho pessoal e por isso, a minha intenção aqui não é limitar a sua resposta, mas nortear a sua linha de pensamento, que espero, vá bem além!
Então? Pronto? Vamos lá!
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Imagem: Divulgação |
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Matrix e a Filosofia
A concepção platônica da realidade indica a existência de dois mundos: o que é perfeito, real, constante, onde reina a verdade absoluta e de onde se originam as ideias - o mundo inteligível; e o que não passa de uma mera reprodução imperfeita e efêmera - assim como sobras de imagens - o mundo sensível.
Matrix correlaciona a realidade virtual manipulada por computadores com o mundo sensível, que é enganoso e incompleto. Perceber falhas na Matrix (ter um dejavu), encontrar nela limitações e regras que "podem ser quebradas ou ignoradas", equivale a desmascarar a simulação, e a compreender a existência de algo maior, mais perfeito, mais real do que aquele mundo onde as pessoas estão mentalmente presas.
O verdadeiro mundo, no filme - comparável ao mundo inteligível de Platão - não é agradável nem bonito, mas mostra-se "perfeito" por ser real. Assim como Platão, o roteirista do filme define a realidade mais verdadeira por ser expressa em liberdade. O conceito de perfeição expressa-se, ainda, por nele não ser possível ignorar leis naturais (por exemplo, a morte ou a lei da gravidade), e também por as pessoas poderem ter opção de fazer escolhas por si mesmas, utilizando de livre arbítrio (como Cypher, que optou por trair seus amigos).
A beleza do mundo de ilusões, similarmente ao conceito de Platão, está no que se pode sentir: os cheiros, os sabores, o prazer. E são exatamente essas sensações que ludibriam toda a humanidade, escravizada sem nem ao menos se dar conta. Se eles podem sentir, para eles é real. A escolha de Cypher ilustra a fraqueza humana frente ao desejo de conforto e felicidade, que para ele, é bem atendido pela Matrix. Para Cypher, o que os olhos não veem, o coração não sente, e ele usa de sua liberdade para escolher abster-se dela. Embora mal sucedido, Cypher pôde fazer sua opção.
O nome de Cypher tem uma significação condizente com a sua função na estória: cifra, ou zero. Ele vendeu-se e entregou seus amigos, assim como Judas Iscariotes, na paixão de Cristo. O número zero contrapõe-se ao número um - anagrama traduzido para Neo, o heroi da trama - e, juntos, zero e um formam os algarismos do código binário, a linguagem dos computadores.
Morpheu representa o escravo que se libertou da prisão subterrãnea no mito da Caverna, de Platão. Ele traduz a responsabilidade pedagógica do filósofo: passar a infomação a diante, ensinar e libertar mais pessoas. Neo é conduzido por ele e aprende, gradualmente, a libertar-se das limitações que lhe haviam sido impostas desde o nascimento, e percorre o árduo caminho que lhe foi predito pelo oráculo. Apaixona-se por Trinity e chega a ser conduzido por ela no momento do climax da trama. Juntos, Morpheu Neo e Trinity representam pai, filho e espírito santo, em evidente referência religiosa.

Sócrates empresta sua filosofia muito claramente ao flme, quando o oráculo aponta a Neo sua frase mais famosa: "Conhece-te a ti mesmo". Com essa expressão, Sócrates sugere o autoconhecimento e indica os passos necessários para tal objetivo, segundo a maiêutica - primeiro, libertar-se dos preceitos, das mentiras, e depois, trazer à luz seus próprios conceitos, em liberdade.
Neo passa por tais elapas com muito sofrimento e dor - física e psicológica - e tal passagem é vividamente representada nas cenas que aludem ao traumático momento do nascimento humano. Com o auxílio dos amigos - os ensinamentos de Morpheu e a fé de Trinity, Neo consegue autoafirmar-se como "o escolhido" parte rumo ao seu ápice racional, onde consegue parar projéteis de armas e até mesmo voar.
Claro que, de forma caricaturada, o objetido final do filme é mostrar as imensas possibilidades da mente humana, quando liberta das limitações impostas pelos preconceitos e alimentadas pelo comodismo. Ao tornar-se crítico, o ser humano deixa de lado a alienação e passa a pensar com mais clareza e autenticidade, o que lhe confere como que "super-poderes".
Este texto, como dito anteriormente, é limitado e muitíssimo resumido. Convido o leitor a aprofundar-se com base nestas poucas orientações básicas. Seguem algumas perguntas para ajudar-lhe a filosofar mais a respeito:
Será que estamos prontos para enfrentar a realidade?
Estamos sendo usados?
Procure responder a essas perguntas pensando na nossa fraqueza humana, nas influências sociais, na mídia, na sociedade...
Espero ter ajudado, pessoal.
Abraço a todos!